Cível – nº 27/2021

TEORIA MENOR DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA PREVISTA NO CDC NÃO ATINGE ADMINISTRADOR NÃO SÓCIO DA EMPRESA

Prevista pelo artigo 28, parágrafo 5º, do Código de Defesa do Consumidor, a teoria menor de desconsideração da personalidade jurídica – segundo a qual poderá ser desconsiderada a personalidade quando ela for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados ao consumidor – não é aplicável ao gestor que não integra o quadro societário da empresa. Esses administradores só poderão ser atingidos pessoalmente pela desconsideração no caso da incidência da teoria maior da desconsideração, disciplinada pelo artigo 50 do Código Civil.

O entendimento foi fixado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) que, aplicando a teoria menor prevista pelo CDC, deferiu pedido de desconsideração da personalidade jurídica de uma empresa e estendeu seus efeitos a administradores que não faziam parte do quadro societário.

Relator do recurso especial dos gestores, o ministro Villas Bôas Cueva explicou que a teoria menor de desconsideração da personalidade jurídica, diferentemente da teoria maior, não exige prova de fraude ou do abuso de direito, tampouco depende da confirmação de confusão patrimonial, bastando que o consumidor demonstre o estado de insolvência do fornecedor ou que a personalidade jurídica representa obstáculo ao ressarcimento dos prejuízos.

Comprovação de abuso da personalidade jurídica

Entretanto, o ministro ponderou que o artigo 28, parágrafo 5º, do CDC não dá margem para admitir a responsabilização pessoal de que não integra o quadro societário da empresa, ainda que atue nela como gestor.

Com base em lições da doutrina, o relator apontou que só é possível responsabilizar administrador não sócio por incidência da teoria maior, especificamente quando houver comprovado abuso da personalidade jurídica.

No caso dos autos, contudo, Villas Bôas Cueva apontou que o pedido de desconsideração foi embasado apenas no dispositivo do CDC, em razão do estado de insolvência da empresa executada. Dessa forma, ressaltou, aos administradores não sócios não foi sequer imputada a prática de atos com abuso de direito, excesso de poder ou infração à lei.

“Desse modo, ao acolherem a pretensão do exequente, ambas as instâncias ordinárias conferiram ao artigo 28, parágrafo 5º, do Código de Defesa do Consumidor interpretação que não se harmoniza com o entendimento desta corte superior”, concluiu o magistrado ao afastar os efeitos da desconsideração da personalidade jurídica em relação aos gestores não sócios.

Fonte: STJ

PEDIDO DE RECUPERAÇÃO ALCANÇA CRÉDITO DE CONTRATO A TERMO DE MOEDA COM VENCIMENTO POSTERIOR

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que determinou a submissão de um crédito de mais de R$ 7 milhões, relativo a contratos a termo de moeda (Non-Deliverable Forward, ou NDF), ao plano de recuperação judicial de uma empresa de fertilizantes.

O colegiado concluiu que os créditos decorrentes de contratos a termo de moeda submetem-se aos efeitos da recuperação ainda que o vencimento ocorra após o deferimento do pedido de soerguimento.

No contrato a termo de moeda, há uma operação de proteção (hedge) diante de riscos decorrentes da variação cambial, relacionados especialmente à eventual perda de paridade em negociações realizadas por quem vende predominantemente em determinada moeda, mas adquire insumos em outra.

Exigibilidade submetida a evento incerto

“O evento que torna exigível a prestação por um dos contratantes é incerto (taxa de câmbio futura), mas a obrigação de pagar, apesar de sua indeterminação inicial, foi assumida já no momento da assinatura da avença”, afirmou a relatora do recurso especial, ministra Nancy Andrighi, ao confirmar a necessidade de submissão do crédito à recuperação, nos termos do artigo 49 da Lei 11.101/2005.

No recurso, o banco credor alegou que os créditos derivados de contrato a termo de moeda teriam natureza extraconcursal, pois seus fatos geradores ocorreram depois do deferimento do pedido de recuperação.

Ainda segundo a instituição, as operações NDFs seriam assumidas no âmbito de câmaras ou prestadoras de serviços de compensação e liquidação com regulamentação própria, de forma que seriam aplicáveis os artigos 193 e 194 da Lei de Falência e Recuperação – que impõem um modo específico de liquidação de créditos.

Condições que se realizam no futuro

A ministra Nancy Andrighi explicou que, no momento do vencimento do contrato NDF, se a taxa de câmbio estiver maior do que no momento da contratação, o contratante receberá do banco essa diferença positiva; por outro lado, se a cotação estiver mais baixa, o contratante deverá pagar a diferença negativa ao banco.

“Disso se pode concluir que, à época em que tais contratos são celebrados, além da ausência de definição do valor pelo qual serão liquidadas as obrigações assumidas, também inexiste determinação de quem será o beneficiado pelo ajuste a ser efetivado, haja vista que o resultado das operações NDF está vinculado diretamente à taxa de câmbio futura”, disse a relatora.

Nancy Andrighi lembrou também que, ao julgar o Tema 1.051 dos recursos repetitivos, a Segunda Seção estabeleceu que, para o fim de submissão aos efeitos da recuperação, considera-se que a existência do crédito é determinada pela data em que ocorreu o seu fato gerador.

Origem das obrigações é o contrato

Em relação à regulamentação legal, a relatora apontou que estão submetidos à recuperação do devedor todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos, de acordo com o artigo 49 da Lei 11.101/2005. Em consequência, não são submetidos aos efeitos do processo os créditos cujos fatos geradores ocorreram após a data em que o devedor ingressou com o pedido de recuperação.

No caso dos autos, Nancy Andrighi ponderou que a situação de pendência que perdura até a data de vencimento das operações no contrato a termo não autoriza concluir que o fato que dá origem à obrigação de pagar a quantia apurada seja outro que não a própria contratação.

“A obrigação de pagar imputada à recorrida não pode ser considerada constituída apenas na data prevista para liquidação das operações, haja vista que a existência do crédito correlato tem como fonte direta o negócio jurídico travado entre as partes contratantes”, sublinhou a ministra.

Ao manter o acórdão do TJSP, a relatora enfatizou que, se a forma como as partes irão suportar os efeitos das operações está pactuada desde a data da celebração, e se a produção desses efeitos não depende da prática de nenhum outro ato, “é impositivo reconhecer que a origem, a fonte, o fato gerador das correspondentes obrigações é o próprio contrato, cuja eficácia plena se manifesta desde a assinatura”.

Fonte: STJ

CREDOR NÃO RESPONDE POR HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS SE DESISTIR DA EXECUÇÃO ANTES DA CITAÇÃO E DOS EMBARGOS

Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a desistência da execução antes da citação leva à extinção dos embargos opostos posteriormente, ainda que tratem de questões de direito material. E, sendo a desistência apresentada antes da citação e da oposição dos embargos, e antes também da constituição de advogado do devedor nos autos, o credor não responde pela sucumbência.

A controvérsia julgada pelo colegiado se originou em ação de execução proposta pela dona de uma empresa de locação de equipamentos contra um consórcio de três empresas de engenharia.

Houve requerimento de desistência, mas os devedores discordaram e apresentaram embargos. O juízo de primeiro grau indeferiu o pedido da devedora, porém se retratou e homologou a desistência, sem fixar honorários na execução. No entanto, ao também extinguir os embargos, determinou o pagamento de verba de sucumbência para cada embargante.

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais reformou a sentença para julgar procedentes os embargos e majorar os honorários. No recurso ao STJ, a locadora de equipamentos sustentou que a execução e os embargos deveriam ser extintos sem resolução do mérito e sem o pagamento de sucumbência.

Extinção da execução prejudica os embargos

Segundo o relator, ministro Villas Bôas Cueva, o STJ entende que os embargos do devedor são ação de natureza autônoma com o objetivo de minorar ou extinguir a pretensão do credor contida em título extrajudicial.

Todavia, ressalvou o ministro, apesar da autonomia dos embargos do devedor, a sua propositura depende da prévia existência da relação processual entre exequente e executado, com a efetiva ocorrência de citação ou de comparecimento espontâneo do devedor aos autos; e da ausência de fato anterior que impeça a continuidade da demanda executiva.

Na hipótese em julgamento, observou o magistrado, antes da citação dos devedores, a credora postulou a desistência. “Assim, os embargos opostos carecem de pressuposto de existência ou de constituição válida, visto que a desistência apresentada antes da citação faz com que o processo principal (execução) seja extinto precocemente e a demanda incidental (embargos) fique prejudicada”, afirmou.

Embargos exigem relação processual na execução

Villas Bôas Cueva frisou também que “a autonomia dos embargos do devedor não é absoluta”, tanto que o seu cabimento está intrinsecamente ligado à formação da relação processual na ação executiva. “E é por isso que a outra característica dos embargos é o seu vínculo de incidentalidade com a execução (processo principal)”, destacou.

Para o relator, a aplicação do artigo 569, parágrafo único, do CPC/1973 pressupõe que a desistência da execução tenha sido apresentada após os embargos. “Por outro lado, se a desistência ocorrer antes da oposição dos embargos, estes devem ser imediatamente prejudicados independentemente de versarem a respeito de questões processuais ou materiais”, afirmou.

Segundo Villas Bôas Cueva, se a petição de desistência foi apresentada antes da citação, os embargos devem ser julgados extintos sem resolução de mérito, devendo ser restabelecida a sentença de primeiro grau.

Cabimento de honorários sucumbenciais

O ministro declarou ainda que, no processo civil, a definição de quem pagará os honorários deve considerar não só a sucumbência, mas também o princípio da causalidade, segundo o qual a parte que deu causa à instauração do processo deverá suportar os ônus sucumbenciais (REsp 1.223.332).

O magistrado lembrou que a Quarta Turma do STJ tem entendimento no sentido de que o credor responde pelos honorários quando a desistência da execução ocorre após a constituição de advogado e a indicação de bens à penhora, independentemente da oposição de embargos (AgInt no REsp 1.849.703). Entretanto, na hipótese julgada, antes da desistência, os devedores não constituíram advogado nos autos e não praticaram nenhum ato processual, o que só ocorreu após a citação.

Ao dar provimento ao recurso especial e julgar extintos os embargos, o relator concluiu que “não há como atrair para o exequente a aplicação do princípio da causalidade”, devendo ser afastada sua condenação ao pagamento da verba honorária.

Fonte: STJ

Demora de porteiro para entregar citação a empresário não torna inválida a comunicação processual

A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho reconheceu a validade de citação relativa a uma reclamação trabalhista que só foi encaminhada a uma microempresa, pelo porteiro do prédio, 34 dias depois de entregue, motivando a ausência à audiência e a aplicação da pena de revelia. Como o endereçamento da correspondência estava correto, os ministros consideraram a citação regular.

Portaria

Sem a apresentação de defesa pelo microempresário, que não compareceu à audiência, realizada em 6/6/2018, o juízo da Vara do Trabalho de Cruz Alta (RS) reconheceu o vínculo de emprego de um programador de software que havia trabalhado como pessoa jurídica durante um ano. Ao recorrer da decisão, o empregador sustentou que só tivera conhecimento do processo ao receber a notificação das mãos do porteiro do prédio onde reside e onde funciona a empresa, em 25/6/2018. Contudo, admitiu que o porteiro tinha recebido a citação em 22/5/2018.

As penas de revelia e confissão ficta foram anuladas pelo Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS), que considerou nula a citação. Apesar de a Súmula 16 do TST presumir recebida a notificação 48 horas após a postagem, o TRT entendeu que ela só se aplica quando não houver outros elementos que indiquem a data em que a parte, de fato, tomou ciência do ato processual.

Validade da citação

A relatora do recurso de revista do empresário, ministra Delaíde Miranda Arantes, entendeu que a decisão do TRT contrariou a Súmula 16. Ela explicou que, conforme essa jurisprudência consolidada, cabe ao destinatário comprovar o não recebimento da citação. “O empresário, certamente, não se desincumbiu, satisfatoriamente, desse encargo”, assinalou. “Muito pelo contrário, ratificou a entrega correta no endereço indicado pelo programador, não sendo aceitável a justificativa de que sua entrega pessoal somente tenha ocorrido 34 dias depois do recebimento da correspondência”.

Impessoalidade

De acordo com a relatora, a citação, no processo do trabalho, rege-se pela regra da impessoalidade: a notificação é enviada via postal para o endereço do reclamado, presumindo-se a entrega após 48 horas da postagem, quando remetida para o endereço correto. “No caso, não há nenhuma controvérsia de que o mandado foi endereçado corretamente e recebido a tempo no seu destino, afirmou”.

A decisão foi unânime.

Processo: RR-20226-73.2018.5.04.0611

Fonte: TST

Mais Publicações